Explorando a arte Cristã: Um olhar profundo para a criatividade antiga

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Quando mergulhamos na história da arte cristã, uma das épocas mais curiosas para explorar é a era em que Jesus Cristo viveu. Embora as representações artísticas dessa era e as posteriores possam parecer distantes e até enigmáticas para nós hoje, investigar as primeiras manifestações artísticas pode nos oferecer uma compreensão mais profunda não apenas da estética da época, mas também das pessoas e dos eventos que moldaram o mundo em que Jesus viveu.

Contexto cultural e religioso

Para compreender verdadeiramente como a arte cristã e as representações de Jesus foram surgindo, devemos primeiro entender o contexto cultural e religioso no qual ela floresceu. A Palestina do século I era uma região vibrante, marcada pela interseção de diversas influências culturais. Estava sob domínio romano, mas também era habitada por judeus, gregos, egípcios e outros povos, cada um contribuindo com sua própria herança artística, familiar e religiosa, uma bagagem que muitas vezes molda a arte de maneira consciente ou inconsciente. Sendo assim, nem tudo o que é representado é literal ou religiosamente aceito para a maioria, dado as influências e o meio.

Em geral a religião desempenhava um papel central na vida cotidiana das pessoas na Palestina antiga, e isso se refletia profundamente em sua arte. O judaísmo, com suas proibições contra a idolatria e sua ênfase na adoração de um Deus invisível, influenciou significativamente as representações artísticas da época. A arte judaica, portanto, tendia a ser mais abstrata e simbólica, em contraste com a arte greco-romana, que frequentemente celebrava figuras divinas e humanas em formas realistas.

As primeiras representações de Jesus Cristo

Até se chegar na figura que popularmente conhecemos de cristo, se é que dá para se chegar a um consenso, temos que lembrar que o cristianismo, assim como outras linhas religiosas, foram na verdade conquistando os povos paulatinamente, e ganhando diferentes interpretações mesmo após o cristianismo primitivo, gerando o que atualmente também conhecemos como denominações. Segundo Christopher Partridge, da Universidade de Chester, e também editor do “Dicionário de Religiões Contemporâneas no Mundo Ocidental”, existem atualmente 33.830 denominações cristãs diferentes, incluindo Igreja Católica, Igreja Batista, Igreja Luterana, Igreja Anglicana, Igreja Pentecostal, Igreja Neopentecostal; entre uma abundância de denominações. E como sabemos, além da perícia e estilo de cada artista, principalmente dependendo da denominação que este último segue, até hoje o artista tenderá a inserir as características da doutrina que ele segue.

O “retrato” mais antigo que se conhece de Jesus é, no mínimo, intrigante. É o grafite de Alexamenos, gravado em gesso, uma pintura blasfema feita entre os séculos I e III, que zomba de um indivíduo chamado Alexamenos por adorar um burro. Sabe-se que ela se refere a cristo também pela tradução da inscrição, que seria “Alexamenos adora seu Deus”.

Fonte: Wikipedia Commons

Esse trabalho é encontrado no Museu Antiquário do Palatino, em Roma. E claro que esta representação não possui cunho religioso, e sim um ponto de vista bem debochado.

Outra representação, é a Cura do Paralítico, feita por volta de 232 d.c. Uma representação de Jesus, com cabelos curtos e vestimenta romana, no momento em que Jesus realiza a cura de um paralítico em Cafarnaum, um episódio registrado nos evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas. Devido à multidão que o cercava enquanto ele pregava em uma casa, as pessoas encontraram dificuldade em se aproximar de Cristo. Então, algumas delas fizeram um buraco no telhado do local e desceram o homem paralisado em um colchão, usando cordas. Foi nesse momento que Jesus teria proferido uma de suas frases mais célebres: “Levanta-te e anda!”

Fonte: Wikipedia Commons

Está preservada nas ruínas da igreja mais antiga já descoberta por arqueólogos no templo de Dura Europos, localizada na atual Síria, próxima à fronteira com o Iraque.

Outra obra interessante é a representação de cristo encontrada na tumba de Calisto I, de 250 d.C. Com uma pequena túnica e um animal nos ombros, a imagem de Jesus é muito semelhante a imagem de Hermes, do panteão grego, mas a figura é uma referência a obra literária O Pastor de Hermas, do século II d. C., considerada parte integrante do cânon bíblico pelos primeiros padres do cristianismo; porém, foi posteriormente considerada apócrifa.

Fonte: Wikipedia Commons

Há uma representação encontrada em um túmulo de uma criança, chamada Severa, com a inscrição “In Deo vivas” (Viva em Deus). Ao lado vemos as figuras dos reis magos apresentando os presentes ao menino jesus que havia nascido, visível no colo de Maria, e logo atrás o seu pai José, e a estrela de Belém logo a frente dos três. A representação faz referência ao Natal.

Fonte: Wikipedia Commons

Mais uma obra de catacumbas. Nesta uma mulher é curada ao tocar na roupa de Jesus, como diz a passagem bíblica de São Mateus e São Marcos.

“Certo dia, ela viu Jesus rodeado de muitas pessoas. Ela acreditava que ficaria curada só de tocar as vestes de Jesus; por isso abriu caminho em meio à multidão e tocou suas vestes.”

Fonte: Wikipedia Commons

Esta obra abaixo esta presente nas catacumbas de dois mártires do catolicismo: Pedro e Marcelino, onde Jesus possui uma aparência e vestimenta mais próxima dos romanos. É do século IV.

Fonte: Wikipedia Commons

A próxima é provavelmente a representação mais antiga de Jesus de barba. Foi encontrada nas catacumbas de Comodila, em Roma. Nas laterais temos as letras alpha e ômega, a primeira e a última letra do alfabeto grego, para indicar que Jesus era o começo e o fim de todas as coisas. Esta é uma obra do século IV.

Fonte: Wikipedia Commons

Estilos e técnicas artísticas

Os artistas da Palestina nos tempos de Jesus empregavam uma variedade de estilos e técnicas para expressar sua fé, cultura e identidade. A escultura era uma forma de arte relativamente menos prevalente devido às proibições judaicas contra a idolatria, mas ainda era praticada, especialmente em contextos seculares e pagãos. A cerâmica era uma forma de arte muito difundida, com vasos decorativos e utensílios domésticos muitas vezes adornados com padrões geométricos e motivos simbólicos.

No entanto, é na pintura e na arte decorativa que encontramos algumas das expressões mais ricas e significativas da época. Murais, afrescos e mosaicos adornavam templos, sinagogas e residências particulares, oferecendo vislumbres vívidos da vida e das crenças das pessoas comuns. Estes trabalhos muitas vezes retratavam cenas do cotidiano, paisagens naturais, bem como temas religiosos e mitológicos.

Temas religiosos na arte

A arte religiosa desempenhou um papel fundamental na vida espiritual e cultural das comunidades da Palestina no tempo de Jesus. As sinagogas eram locais de encontro não apenas para adoração e estudo, mas também para apreciação artística. Os interiores das sinagogas eram frequentemente decorados com pinturas murais que retratavam histórias bíblicas e passagens religiosas, destinadas a inspirar e instruir os fiéis. Vale destacar que estas representações “faziam escola” dos novos artistas, pois além de reforçar um modelo comumente aceito, seja ele condizente com a realidade ou não, ditavam e influenciavam o pensamento dos novos fiéis.

Além disso, a arte religiosa também era uma forma de afirmar a identidade e a autonomia das comunidades judaicas em meio à dominação romana. Muitas vezes, essas representações artísticas enfatizavam a relação especial entre Deus e o povo de Israel, destacando histórias de libertação e redenção que ressoavam profundamente com os judeus sob ocupação estrangeira.

Influências externas e sincretismo cultural

Embora a arte na Palestina do século I tenha sido fortemente influenciada pelo judaísmo e pela cultura local, também refletia as influências externas, especialmente do mundo greco-romano. A conquista e a dominação romana trouxeram consigo não apenas mudanças políticas, mas também uma fusão de tradições culturais e artísticas. Elementos da arte grega e romana, como padrões ornamentais, técnicas de composição e temas mitológicos, podem ser encontrados em muitas obras da época. Como já foi mencionado anteriormente, a semelhança da representação de Jesus, presente na tumba de Calisto I com Hermes do panteão grego, fato que deixa evidente como esta influência, e até mesmo fusão das representações religiosas, podem ter se desenvolvido; ainda mais sabendo que as antigas religiões compartilhavam conceitos e princípios atemporais que influenciaram as próximas. Os nomes e as formas poderiam ser diferentes, mas os princípios por si só atraiam os artistas a representar as deidades e seus símbolos para posições e atributos semelhantes, ainda que sua nova crença monoteísta fosse tentar reduzir isso.

No entanto, é importante notar que essa influência externa não resultou em uma mera imitação ou diluição da identidade judaica. Em vez disso, testemunhamos um fenômeno de sincretismo cultural, no qual as tradições artísticas distintas foram fundidas e transformadas para criar algo novo e distintamente local.

O retrato de Jesus ao longo dos séculos

A arte nos tempos de Jesus não apenas refletia as crenças e valores das comunidades da Palestina antiga, mas também deixou um legado duradouro que continua a inspirar e intrigar até os dias de hoje. Através dessas obras de arte, podemos vislumbrar a vida quotidiana de pessoas comuns, as lutas e aspirações de uma sociedade sob domínio estrangeiro, e a busca espiritual por significado e transcendência.

Além disso, a arte antiga nos oferece uma janela única para compreender o contexto histórico e cultural no qual Jesus viveu e pregou. Ao explorar as representações artísticas da época, podemos ganhar uma compreensão mais profunda das parábolas, ensinamentos e milagres registrados nos Evangelhos, enriquecendo assim nossa compreensão da mensagem e do legado de Jesus Cristo.

A antiga arte influenciou veementemente as futuras representações cristãs, assim o mais antigo ícone sobrevivente de Cristo Pantocrator, c. século VI, é ainda a figura que carrega os principais atributos que conhecemos hoje.

Fonte: Wikipedia Commons

Além do mais existem outros tipos de interferência, que são importantes de mencionar no processo criativo. Atualmente continuamos a ver relatos de artistas que mencionaram ter, por exemplo, uma inspiração divina, como é o caso do relatado por uma artista do nosso século Akiane Kramarik. Aos 8 anos, Akiane teve uma súbita inspiração: queria retratar o rosto de Jesus com base em suas visões. Determinada, ela buscou alguém que pudesse servir de modelo por um longo tempo, e por isso ela instruiu sua família a orar para que Deus providenciasse tal pessoa. Em resposta às suas preces, num dia de oração, um carpinteiro misterioso apareceu à porta de sua casa, em busca de trabalho. Ao observar o rosto do homem, Akiane percebeu uma semelhança notável com sua visão. Com convicção, revelou à mãe que ele era o escolhido.

É um assunto tão variável, que até a ciência buscou criar o rosto de cristo, e o resultado foi bem diferente do que comumente se acredita ser, como foi o caso de Richard Neave, aos 79 anos de idade, um cientista forense aposentado da Universidade de Manchester, com especialização em reconstrução facial que resolveu recriar o rosto de Jesus. Mas provavelmente há ou haverá um artista religioso, com inclinação a ciência, que irá mesclar o cristo comumente aceito com a imagem reconstruída por Neave; e assim ditar um novo conceito a nova geração de artistas, mesmo que influencie pouco.

Em última análise, a arte nos tempos de Jesus é um lembrete poderoso da capacidade da expressão artística de transcender as barreiras do tempo e do espaço, conectando-nos de forma tangível com as pessoas e os eventos do passado distante. É um testemunho duradouro da criatividade humana, da busca pela verdade, significado e transcendência em meio às vicissitudes da vida.

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