Uma breve história sobre o Mangá

     por Felipe Silva

     O mangá, que, embora no ocidente e em outros países seja conhecido mais pelo seu estilo diferenciado de desenho (sendo olhos grandes e expressões faciais exageradas suas principais marcas), é um estilo de história em quadrinhos japonês onde tem como principais diferenças dos quadrinhos Norte Americanos e Europeus (isto, é claro, até que o mesmo começasse a exercer influência sobre os estes, como tem acontecido nas últimas décadas) a sua leitura dinâmica, utilização de fragmentos dispersos para compor uma cena ou cenário, a grande variedade de gêneros de histórias, cenários realísticos, personagens icônicos para uma maior identificação do leitor com o personagem, efeitos de fundo para transmitir emoções, entre outros. Porém, para melhor entender como e por que se deram estas características é muito importante estudar os responsáveis pelo impulso do gênero, a influência que os mangás exercem na sociedade japonesa e o período em que se deu a sua popularidade.

 Os pais do estilo

     Se fossemos falar do período exato em que o estilo se deu, dataríamos algo próximo ao séc. VIII D.Cno Japão (onde associavam pinturas e textos que juntos contavam uma história à medida que eram desenrolados), porém, foi com Osamu Tezuka (1928-1989) que se deu a criação e a popularização do mangá no estilo no qual o conhecemos hoje.

    

Osamu Tezuka desde criança teve fortes influências de grandes mestres da animação como Walt Disney e Max Fleischer. Aos dezessete anos, a pedido de Sakai Shichima desenha Shin Takarajima (Nova Ilha do Tesouro),

no qual tem mais de 400.000 exemplares vendidos. Anos depois surge Jungle Taitei (Kimba, o Leão Branco, no Brasil), onde Tezuka passa a ser reconhecido nacionalmente. A partir daí, suas obras, repletas de personagens bem desenvolvidos e cativantes, temas sociais e políticos presentes, uma forma de narrativa rápida e um estilo de desenho dinâmico,

passam a exercer enorme influência sobre outros artistas, principalmente também por causa da diversidade de gêneros que ele explorava (desde mangás shonens (para meninos) como Tetsuwan Atom (Astro Boy), shoujos (para meninas) com Ribbon no Kishi (A Princesa e o Cavaleiro) a seinens (adultos para homens), como Buddha e Metropolis).

     Deste ponto em diante surgem os grandes clássicos que passam a influenciar do modo como os mangás são até os dias de hoje, como a série de boxe Ashita no Joe (1968, por Asao Takanori e Tetsuya Chiba), Cyborg 009 (Shotaro Ishinomore), Doraemon (Fujiko Fujio), Kozure Ookami (Lobo Solitário, de Kazuo Koike e Goseki Kojima), entre outros, que ajudaram a reforçar a diversidade e as características marcantes de cada um dos gêneros.

 

Fatores históricos e sociais que influenciaram no mangá   

   

  O período da popularização do mangá no Japão (por volta de 1950) acontece num período crítico de um país que tenta se reerguer das fortes feridas causadas pela 2° Guerra Mundial (evento que dispensa apresentações). Era o surgimento da nova terra do sol nascente que agora se preocupava principalmente em restabelecer sua economia. Mas o que o mangá tem haver com isso? Como eu disse, era uma nova sociedade, e foram as obras que eram impressas na época que influenciavam toda a juventude e até mesmo os adultos. Imagine como se fosse as novelas aqui no Brasil, só que com uma sociedade ainda mais aberta a idéias. É importante lembrar que os mangás lá são impressos em almanaques de cerca de 500 páginas,

com umas quinze diferentes séries dentro, sendo que algumas dessas revistas eram de periodicidade semanal. Destas revistas haviam as que eram dedicadas aos meninos, outras as meninas, adultos e etc.  Atualmente a gama de diferentes revistas é muito maior. Ou seja, era diversão para toda família (mais um motivo que podemos acrescentar como causa da diversidade de gêneros que o estilo apresenta). Pode-se dizer que nas ruas e escolas o assunto do dia seria algo como: “você leu o último capítulo de Doraeomon que saiu? Foi demais!” O mangá estava presente no dia-a-dia de todos.

     E numa época conturbada como aquela, histórias sobre sonhos e pessoas que buscam seus objetivos tinham uma excelente repercussão, tanto é que ainda hoje vemos o reflexo disso na sociedade japonesa através de frases

como “vamos nos esforçar mais” ou “de o melhor de si”. Isso pode ser visto claramente em Ashita no Joe, onde um jovem dos subúrbios de Tóquio de grande carisma luta para se tornar um boxeador em meio toda a criminalidade e pobreza em que vive, trazendo uma fagulha de vida e esperança aos olhos dos moradores locais.

     O caminho daqui em diante…

     O mangá começou revolucionando as histórias em quadrinhos como eram vistas até então, trazendo inovação tanto na parte gráfica (como onomatopéias exageradas, linhas de ação e etc.)  como também nos seus roteiros que, mesmo quando eram destinados às crianças, não eram nada idiotas. Teve um forte impacto social para um país que se reconstruía do zero e hoje é o fator responsável por movimentar grande parte da economia do país e é, sem sombra de dúvida, de estudo obrigatório aos aspirantes a quadrinistas da atual geração.

      Porém, é claro, nem tudo são flores. Principalmente na última década o estilo tem sofrido grande desgaste de valores devido ao apelo sexual e aos mangás destinados exclusivamente a fins comerciais, trazendo então várias obras vazias que cada vez mais enchem as prateleiras das livrarias e se

tornam um “ponto de refúgio” àqueles jovens que se isolam da sociedade muitas vezes por não receberem uma orientação correta para lidar com seus problemas sociais.

     Em suma, o mangá ainda tem muito a crescer, é um estilo que há décadas encanta pessoas com o valor de suas obras, desde heróis que lutam por algo maior a análises e críticas sociais muito bem trabalhadas. O importante agora é que tenhamos artistas que se comprometam a uma obra de qualidade e de expressão de valores transcendentais e levem, assim, o estilo a um rumo certo.